“Tudo
o que não sei aprendi na escola.”
(Ennio
Flaiano)
Dezessete
anos depois de realizar meu primeiro exame vestibular, tornei
a vivenciar esta experiência ao prestar o concurso
promovido pela Fuvest para seleção dos postulantes
às vagas oferecidas pela Universidade de São
Paulo.
Domingo
ensolarado, dia de final de campeonato brasileiro de futebol,
observo no local do exame uma legião de candidatos,
jovens em sua maioria, que estampam em seus semblantes um
ar de apreensão, tensão e incômodo,
como se estivessem diante de uma decisão que impactará
todo seu futuro.
Cinco
horas de prova e cem questões de múltipla
escolha para dizer-lhes se estarão aptos a transpor
mais um ritual de passagem, chancelando o passaporte para
a vida adulta, marcando o fim da adolescência. A aprovação
significará a certeza de um horizonte na vida profissional,
a conquista de um novo padrão de liberdade e de um
novo status de inclusão social.
Após
algumas instruções gerais e a preocupação
inequívoca do fiscal de prova com o risco de algum
candidato aventurar-se a colar durante a realização
dos testes, o caderno de questões é entregue.
Folheio-o e uma profunda sensação de decepção
toma conta de meus pensamentos.
Nosso
sistema educacional está falido. Inadequado, ultrapassado,
anacrônico. Continuamos formando um exército
de estudantes doutrinados a grafar uma letra “X”
em uma alternativa dentre cinco possíveis. Estamos
desperdiçando a oportunidade de ensiná-los
a pensar, a raciocinar, a criar.
O
exame vestibular considerado o mais bem preparado do Brasil
sinaliza esta realidade com perfeição. As
questões de física e química remetem
todas ao uso de fórmulas e equações
que precisam ser decoradas pelo estudante para serem utilizadas
na solução de problemas absolutamente desconectados
de nosso cotidiano. O sujeito aprende a mensurar a velocidade
de arrasto de um peso ancorado em uma polia bem como fazer
o cálculo estequiométrico de uma reação,
mas não sabe trocar o chuveiro de sua casa, compreender
como o consumo de seus equipamentos eletroeletrônicos
afeta sua conta de energia elétrica e o porquê
de a adição de álcool à gasolina
reduzir a potência de seu carro.
Mais
algumas regras memorizadas e se está habilitado a
estimar a altura “h” de um triângulo escaleno
inserido em um poliedro ou a probabilidade de se extrair
uma seqüência de bolas coloridas mediante determinada
combinação pré-estabelecida, mas não
se dispõe de instrumental suficiente para calcular
os juros embutidos nas prestações de um produto
vendido “em oferta” por uma loja de departamentos.
Aprende-se
a vital diferença entre angiospermas e gimnospermas,
sem nunca se ter visitado um jardim botânico ou atravessado
a rua até o parque ou praça mais próximos.
Aprende-se sobre como se dá a fotossíntese,
mas evita-se falar em educação ambiental.
Gametas e zigotos são explorados ao longo de todo
um ano, mas educação sexual deixa de ser discutida.
Ignoram-se
a crise política no país e os conflitos étnico-religiosos
no mundo, para se falar sobre as características
do feudalismo. Questiona-se sobre as características
físicas ou da personalidade do protagonista de um
romance, mas não se promove o prazer pela literatura
através da leitura despretensiosa.
Vestibulares
existem para alimentar uma rentável indústria
formada por cursinhos preparatórios e mesmo para
justificar as altas mensalidades cobradas por muitas instituições
de ensino médio que se notabilizam pelo elevado índice
de aprovação de seus rebentos nestes concursos.
A
verdade lastimável, preocupante e penosa é
que nossos jovens continuarão pagando elevados juros
no cheque especial, cartões de crédito e compras
parceladas; permanecerão engordando os indicadores
de gravidez precoce e doenças sexualmente transmissíveis;
seguirão destruindo o meio ambiente tomado por empréstimo
dos filhos que ainda vão ter; persistirão
elegendo maus governantes.
A
Educação é o meio de se construir uma
nação mais equânime num futuro próximo.
Sinto que a argamassa não está sendo elaborada
com boa qualidade e que nossos alicerces estão cada
vez mais frágeis...
Tom
Coelho, com formação em Economia
pela FEA/USP, Publicidade pela ESPM/SP, especialização
em Marketing pela MMS/SP e em Qualidade de Vida no Trabalho
pela FIA-FEA/USP, é empresário, consultor,
professor universitário, escritor e palestrante.
Diretor da Infinity Consulting e Diretor Estadual do NJE/Ciesp.
Contatos: tomcoelho@tomcoelho.com.br
Visite: www.tomcoelho.com.br
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