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Os Poucos Centímetros e MadaLena |
Noite
fria. O telefone toca e a voz inconfundível de MadaLena
- Tudo bem? Pedi alguns segundos e coloquei caneta e papel
na minha frente e atendi com a minha ansiedade em alta efervescência.
Após
os costumeiros cumprimentos e as notícias sem muita
importância, MadaLena começou a narrar sua
nova história. Eu a tomar notas.
Há
quinze anos que os móveis de trabalho do órgão
público onde MadaLena trabalha não eram trocados,
surgia finalmente verba para modernização
que tanto se esperava.
MadaLena
aproveitou para pedir que um dos novos armários ficasse
encostado em uma parede, junto a um cofre que ainda é
utilizado para os processos confidenciais. O ganhador da
licitação enviou uma arquiteta e um ajudante
que passaram a tirar as medidas de todos os espaços,
das paredes, do chão, distância das tomadas,
telefones, enfim, um completo levantamento físico.
Alguns
dias depois chegaram as novas mesas, cadeiras, mesas de
apoio e o famoso armário. Só que na hora de
colocá-lo encostado na parede, perceberam que por
alguns centímetros ele era maior que o espaço
destinado ao mesmo. Duas soluções possíveis:
ou deixavam assim mesmo e o armário roubaria cerca
de 10 centímetros da passagem ou fariam um corte
em algumas prateleiras, que o marceneiro responsável
pela montagem chamou de “porta-trecos”.
Mada
ouviu atenciosamente enquanto seus colegas engoliam em seco.
Solicitou que fossem refeitas as medidas e percebeu que
a primeira medição tinha um erro de alguns
centímetros. Ao que o marceneiro exclamou –
Mas não tem problema não “dona”
o que são alguns centímetros de diferença?
Na
conversa que tivemos, Mada explicava a grande dificuldade
das pessoas em atender a essas questões de qualidade
no produto final. Seus funcionários e colegas negociam
prazos, objetivos, são verdadeiros heróis
na quantidade de trabalho desenvolvido, mas na qualidade...
Contei-lhe
também que nos eventos que ministro tenho um exercício
que faz exigências sobre o exato tamanho daquilo que
será produzido, mas que invariavelmente as equipes
esquecem desse importante requisito de qualidade. Afinal,
como disse Mada, um erro de alguns centímetros na
rota de uma espaçonave pode significar quilômetros
de distância no destino final.
O
retrabalho foi o principal foco de argumentação
que MadaLena aproveitou para colocar, tanto para os montadores
do mobiliário quanto para os seus funcionários.
Acabou
ilustrando essa lição de forma clara: - Essa
é a nossa missão, planejar cuidadosamente,
medir exaustivamente, para ter certeza que ao final o produto
terá todos os requisitos de qualidade contemplados.
Custa muito mais refazer todo o trabalho do que executar
um plano correto apenas uma vez, muito embora às
vezes possa levar mais tempo. Ganhamos na qualidade do produto
e a certeza de atendermos com eficácia e eficiência
nosso cliente.
Foi
nesse momento que com um olhar severo Mada virou-se para
o marceneiro-chefe e disse: - E quanto ao seu “porta-trecos”...
Desse
ponto em diante não posso revelar o que ela falou.
Fica aqui apenas um lembrete interessante: Você faz
questão de atender com total qualidade o seu cliente,
até nos detalhes, com medidas exatas?
Armando
Ribeiro |