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- Só Uma Parte da História

Dias atrás estava ouvindo noticia que exaltava a situação de um jovem desempregado formado em Direito estar numa fila enorme para inscrição num concurso de gari. Na mesma semana um amigo de Recife mandou e-mail perguntando, entre surpreso e indignado, sobre o que eu achava de uma pessoa formada em medicina prestar concurso para policial rodoviário federal.

A primeira análise simplista dos noticiários, analistas econômicos, parlamentares e tantos outros, levam-nos a pensar em duas conclusões. A primeira é a crise do emprego. A segunda é a incompetência do governo. Nada mais real, justo e autêntico. Entretanto só uma parte da história está sendo contada.

As análises são feitas sem um estudo, mínimo que seja da história brasileira. Tornar-se funcionário público é o sonho de milhões de brasileiros desde que por aqui chegaram os portugueses, instalaram sua corte ou parte dela. Depois na brevíssima história do nosso império, também ficaram as marcas dessa tão sonhada carreira pública. Sempre foi uma forma de ficar perto do poder e estar assegurando para si, para a família e para seus descendentes, conforto, prestígio, algum luxo e alguma fartura.

Fato que não é mencionado: mesmo nos momentos em que o mercado privado oferecia mais empregos, os concursos sempre estiveram recheados de pessoas com qualidades, competências, habilidades e características muito além do que era exigido em diversos casos.

A sociedade quer funcionários públicos bem preparados, competentes e profissionais de primeira linha. Para isso os governos sempre usaram uma única estratégia: pagar salários, em alguns casos, maiores do a média do mercado para atrair os melhores candidatos. Oferece ainda para reter essa massa de novos funcionários, trabalho muito aquém da sua competência, estabilidade e garantia de aposentadoria. Em outras palavras – altos salários e baixo risco de desemprego. Uma vez dentro da carreira pública, pouco importa se sua produtividade é alta ou baixa, basta não ficar abaixo da exigência mínima e certamente o servidor jamais sofrerá a ameaça de desemprego. Ao contrário o mercado privado oferece altos salários somente àqueles que estão dispostos a produzir mais e melhor, o que gera maior risco. Como dizia meu pai – Depois que entrou é só encostar o boi na sombra e não pisar no balde!

Juntamos a essas questões acima a pergunta fatal: o que leva um profissional formado num curso superior tentar uma carreira pública que nada tem de congruência com sua formação? Arrisco uma resposta: é apenas pelo salário, estabilidade e por simples SOBREVIVÊNCIA. Uma vez dentro do órgão público vai verificar se poderá aplicar o que aprendeu. Aprenderá conceitos, habilidades e competências, para justificar minimamente para si e para a sociedade o dinheiro que está recebendo mensalmente.

Que tipo de trabalho poderemos esperar de um médico, que estudou com afinco, seis ou mais anos, exercendo funções de um policial rodoviário? Ou ele se adapta a nova realidade e joga fora tudo que estudou e preparou ou será evidentemente um péssimo profissional. Sonhará sempre com o que poderia ter sido e não o é.

Ao órgão público que seleciona através de concurso, na maioria dos casos, pouco importa o que o candidato fez, mas sim o que sabe na teoria. A prática é deixada para uma segunda etapa. O que se espera dos candidatos aprovados é um bom conhecimento teórico de alguns temas, que nem sempre tem ligação com a atividade a ser exercida. Essa prática parece nivelar os candidatos e fornece chances iguais para todos. Nos processos seletivos das empresas privadas somente o conteúdo teórico, tão valorizado nos concursos públicos, tem pouco peso na contratação.

Entretanto nada é mais justo do que ter um salário bom e garantias de emprego, estabilidade, fartura e prestígio social. A esmagadora maioria do funcionalismo consegue com o passar dos anos, aprender a gostar do que faz. Tornam-se excelentes profissionais e reconhecem-se como pessoa e cidadão.

Conseguem, ao longo do tempo, superar alguns desafios de organizações com estruturas viciadas, com a falta de profissionalismo das elites dirigentes, que são escolhidos na maioria das vezes não pela competência na gestão da coisa pública, mas sim na indicação político partidário, amizade, conchavos ou acertos escandalosos. Profissionais públicos que são capacitados para gerenciar e montar verdadeiras equipes nos órgãos públicos, capazes de atingir a qualidade nos serviços, existem aos milhares, infelizmente não são eles os escolhidos para a maioria dos cargos de confiança e de gestão.

Uma última questão é a da escolha da profissão. É permitido a todos nós humanos errar nessa escolha. A frustração pode ser substituída pela escolha de outra profissão. Entretanto para mais de 90% da população brasileira não há tempo para uma nova escolha. É preciso trabalhar e exercer uma atividade que lhe dê o sustento e que proporcione condições mínimas de sobrevivência. Uma saída honrosa é o concurso público.

A conclusão a que chego, deixa mais perguntas, do que respostas. É necessária uma pesquisa mais aprofundada. Entretanto quero afirmar que olhar por apenas um ângulo é prejudicial. Não reflete a realidade e nem, muito menos, a verdade.

Não há culpados nessa história. Tanto a elite e o governo que a representa, quanto à massa de trabalhadores, teêm sua parcela de responsabilidade na manutenção desse sistema.

Abre-se aqui um debate que está longe de terminar, pois nas próximas décadas ninguém vê horizonte de pleno emprego. O servidor público, como pretendem alguns, será em muitos momentos, responsabilizado pelos governos e pela classe dominante como o responsável pelo déficit público, devido aos altos salários (sic). Os altos salários que continuarão a ser oferecidos nos concursos.

Funcionários públicos continuarão a ser responsabilizados pelo deficiente atendimento, sem a verificação das condições precárias que são oferecidas e os baixos salários que recebem. Sim aqui uma última verdade: a grande maioria dos salários oferecidos pelos órgãos públicos é aviltante. Um exemplo: os salários dos professores.

Será sempre notícia. Repetida nos últimos 400 anos. E ainda será contada apenas uma parte da história...

Armando Ribeiro



 

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